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Darino Sena

Darino Sena: A morte iminente do gol

(darino.sena@gmail.com)

Atenção amante do futebol! O maior prazer que este esporte te proporciona está com os dias contados. A comemoração do gol está na UTI. Respirando por aparelhos. Prestes a morrer. O algoz? A Fifa.

Se a utilização do árbitro de vídeo, ainda em fase de testes, vingar, esqueça aqueles seus momentos épicos, como a comemoração enlouquecida pelo gol de seu time no último minuto de uma final de campeonato. Aquele que valeu título sobre o maior rival, lembra? No futuro você não vai viver essa emoção. Nem por esse, nem por gol nenhum.

É que antes de correr pra abraçar os desconhecidos ao lado que acabaram de virar seus amigos de infância, você vai ter que esperar. Dois, três, quatro, cinco minutos... uma eternidade! Em vez de soltar a voz com aquele grito de gol preso na garganta, às vezes, por anos, você vai ter que se conter. Antes de festejar o artilheiro do gol libertador, você vai ter que olhar para o árbitro.

Aguardar, pacientemente, que o homem que um dia já se vestiu de preto consulte seus pares, confinados num caminhão de TV perto dali. Enquanto a patota de apitadores analisa friamente os replays e debate, você sofre, espera... Eles conversam, o estádio cala. Já imaginou, a Fonte Nova ou o Barradão lotados, todo mundo quieto, logo após um gol do Bahia ou do Vitória?

A emoção instantânea e única que só o gol do nosso time é capaz de trazer e, que é impossível descrever, vai ser reduzida a uma mera expectativa, ainda que angustiante. Que pode virar revolta, caso os confrades decidam anular o tento. E que, no caso do gol ser confirmado, vai virar... sabe-se lá o quê. Independentemente da decisão da arbitragem, o estrago já estará feito.

O gol vai ser validado, representará o título, você vai até comemorar, mas não vai ser a mesma coisa – aquele sentimento inexplicável que vem no peito, genuíno e imediato, que só o gol é capaz de provocar. Esse já terá se perdido.

Estão querendo matar o que há de mais original no nosso esporte preferido. Talvez aquilo que explique o porquê do futebol ser tão adorado: o nosso deleite ao gritar e celebrar o que o futebol tem como seu maior diferencial em relação a outras modalidades – o gol. Aquele que já foi “o grande momento do futebol”, vai virar o grande momento da arbitragem.

Antes eu tinha dúvida se o recurso eletrônico seria benéfico. Agora que ele começou a ser usado pra valer, vide a atual Copa das Confederações, não tenho mais dúvida nenhuma. O árbitro de vídeo mexe com a essência do jogo. Chegou pra matar o gol.

As discussões antes da implementação do recurso eletrônico eram todas válidas. Também não duvido das intenções dos idealizadores e de quem o defendeu. Mas agora que a aplicação se mostra um verdadeiro desastre, ao tirar o protagonismo dos jogadores e os transferi-lo para os árbitros, é um absurdo ser levado adiante.

O futebol moderno se tornou o fenômeno de popularidade mundial que é por preservar a sua essência ao longo de quase dois séculos de prática. As mudanças que sofreu foram pontuais e não alteraram a dinâmica do jogo, nem dentro, nem fora de campo. Já o árbitro de vídeo mexe e descaracteriza duas das coisas mais sagradas da nossa maior paixão – o gol e a forma de torcer. Ninguém tem o direito de ir tão longe. Nem mesmo a Fifa. Ou o futebol mata o árbitro de vídeo, ou ele o ferirá de morte.

*Darino Sena é jornalista e escreve às terças-feiras

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