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Miro Palma

Miro Palma: O futebol precisa de mais amor

Miro Palma (miro.palma@redebahia.com.br)

A primeira vez que eu entrei em um estádio tinha 7 anos. Foi em 1993, na Fonte Nova, em sua antiga versão, em um jogo entre Bahia e Bragantino pelo Campeonato Brasileiro. Placar de 1x0 para o Bahia, gol de Marcelo Ramos. Não foi um jogo marcante na história dos clubes, não valeu título, não teve recorde de público. Mas, até hoje, eu lembro do passe de Naldinho que deixou Marcelo na cara do gol, sem chances para o goleiro adversário. Lembro do caminho de chegada à Fonte ao lado de meu pai, lembro da gritaria na hora do gol. Eu estava diante de um espetáculo que marcou a minha vida: o início de uma paixão.

Infelizmente, o garoto Heitor, de apenas 5  anos, torcedor do Goiás, não teve a sorte de descobrir essa paixão. O menino, que tinha ganhado o direito de acompanhar um dos jogadores ao entrar em campo no início da partida no Serra Dourada, se viu em meio a uma guerra entre torcedores do Goiás e do Vila Nova, no jogo do dia 24 de maio pela Série B do Brasileirão. Assustados, Heitor e seu pai, Warley Ferreira, que já tinha parado de ir ao estádio em clássico goiano, se viram encurralados ainda mais com a chegada da polícia para conter a briga. Imediatamente, Warley levantou as mãos para demonstrar que não fazia parte da confusão, e Heitor, com medo, reproduziu o gesto do pai.

A imagem de Heitor, um menino – repito – de apenas 5  anos, com as mãos pra cima, no colo de seu pai, diante de uma horda de baderneiros, correu o país e se tornou um símbolo do atual cenário do futebol brasileiro: onde a violência sobrepõe o esporte nas manchetes dos jornais. Foi assim, menos de 15 dias depois, nos jogos entre Inter e Criciúma, no Beira-Rio, e Vasco e Flamengo, em São Januário, ambos no último sábado. Mais uma vez os campos de futebol se transformam em campos de batalha.

Nesses outros dois casos, as emissoras de TV também transmitiram imagens chocantes de pais, mães, crianças, jovens e idosos tentando fugir da violência. Em meio a pancadaria, mulheres chorando, pais tentando retirar seus filhos amedrontados, pessoas invadindo camarotes e cabines de imprensa para se proteger. E quem estava no meio da confusão, como o torcedor do Vasco David Rocha Lopes, de 27 anos, morreu. E aí fica a pergunta: você acredita que essas pessoas vão voltar às arquibancadas tão cedo?

Heitor e seu pai garantiram que não. O menino, que no dia só saiu do colo do pai depois de conseguirem entrar no carro, está com a pior lembrança que um torcedor pode carregar de uma partida: o medo. Assim como ele, muitos outros torcedores estão abandonando os estádios por medo da violência entre torcidas organizadas, baderneiros e vândalos.

Meu pai, Seu Palma, que me levou para assistir pela primeira vez um jogo de futebol num estádio, já não vai mais a duelos entre Bahia e Vitória. Ele, que nunca deixou de ir a uma partida, nem mesmo a final de 1988, nesse mesmo Beira-Rio que viu pessoas arremessando pedaços de paralelepípedos umas nas outras, e que sagrou o Bahia campeão brasileiro sob o Inter sem nenhum vestígio de violência. Hoje, meu pai evita clássicos por medo da violência. 

Selvageria não combina com futebol. Pedaços de haste de bandeiras, sapatos e bombas também não. Pessoas com as mãos para o alto com medo de apanhar muito menos. O espetáculo do esporte combina com famílias e amigos, com torcedores apaixonados e com crianças que descobrem no primeiro gol que assistem ao vivo que aquele lugar, aquela cadeira ou aquele degrau de cimento é o melhor local do mundo para se emocionar.

Miro Palma é subeditor de Esporte e escreve às quartas-feiras

 

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