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Nelson Cadena

Nelson Cadena: o nosso Palace

O Palace Hotel nasceu abençoado por Deus. Senão pelo próprio, pelos seus mais ilustres representantes no país, em torno de uma centena de bispos e sacerdotes, um grupo homogêneo que vestia batinas roxas e pretas e chapéus de aba e que logo após o nascer do sol, no domingo, 3/9/33, aguardava na porta do belo edifício os carros que transportariam os prelados até o Estádio da Graça onde seria realizada a grande missa campal de abertura do I Congresso Eucarístico Nacional. Nos postes da iluminação pública e nas varandas dos edifícios, galhardetes com as cores do Brasil e do Vaticano e escudos do evento engalanavam a principal rua da cidade.

 

O hotel não tinha sido ainda inaugurado oficialmente, faltava um ano para a conclusão das obras, mas o comendador Bernardo Martins Catarino cedeu para a cúria 30 apartamentos já prontos com banheiro e outros mais simples. O trade da época apoiou o evento, inclusive o Lloyd Brasileiro que locou seus navios com 40% de desconto para transportar os convencionais, mais de 400 embarcaram no Rio de Janeiro; o barco do cardeal Sebastião Leme perdeu a partida, faltou carvão na hora, mas, naquele tempo, um atraso de um dia não era nada assim tão comprometedor.

 

O que os bispos e sacerdotes que se hospedaram no Palace Hotel não sabiam é que o nome do estabelecimento não estava em sintonia com as coisas de Deus, muito pelo contrário, na terrinha era sinônimo de um grave pecado capital: a luxuria. O nome lembrava aos baianos o inferninho das imediações da Praça da Sé, o Hotel Palace, que no início do século foi bar e hospedaria, mas na década de 20 já era “antro de prostituição de escravas brancas”, segundo os jornais, ou seja, as famosas “polacas” que adestraram os baianos nas promíscuas técnicas da mais apurada libidinagem e que, mais tarde, seria casa de jogatina do bom Bacará.

 

Talvez por isso, no ano seguinte, quando da inauguração formal do estabelecimento, em 18/9/34, o hotel, para manter o distanciamento do indesejável nome que sugeria lascívia, apresentou-se na mídia como o “Copacabana da Bahia”. Os anúncios destacavam os quartos de banho nos apartamentos, grill-room e mais os serviços: aeropostal da Air France, de barbearia e o bar americano, especializado em coquetéis. Fazia questão de dizer que era o melhor da cidade. E  era. Fazia sombra ao Meridional, localizado no outro quarteirão, desde 1915 o melhor estabelecimento hoteleiro de Salvador. Ambos exibiam suas belas cúpulas apontando para o céu.

 

Quatro meses após a inauguração, o Palace já cuidava das festas de Momo promovendo nos seus salões cinco gritos de Carnaval. O primeiro contou com a famosa bailarina de companhia de vaudevilles musicadas, Theda Diamant, que fazia o gênero revista brejeira. O último teve como atração o excêntrico músico Gus Browm, a cantora e bailarina internacional Miss Wanda e as mimosas “New York Girls”. E após os gritos que antecipavam o evento, os bailes temáticos atraíram todas as atenções: Festa das Pijamas, Cai Cai Balão, Loucuras de Carnaval, Chegada do Zeppelin e Uma Noite em Tokio onde o destaque era um palácio japonês com efeitos de luzes; no embalo, um grupo de gueixas divertiu os convidados com performances e bailes típicos.

O sucesso foi grande, valia repetir a receita. Durante a micareme o Palace criou o baile Uma Noite em Hong-Kong e nas festas do 2 de Julho contratou os Black Stars; no intervalo do animado 

jazz, o público assistiu ao pianista cubano Bienvenido Hernandez acompanhado da cantora Adolfina Acosta.

 

E, assim, entre as animadas “soirées” dos sábados e as festas temáticas, entre o chá das cinco e o cassino explorado por Alexandre Sonschein, o novo hotel da Rua Chile conquistou turistas e baianos que se orgulhavam de ter a seu serviço o maior e melhor hotel do Norte e Nordeste.

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